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Betina Mariante Cardoso*

“Ele sentia que Sabina se abraçava forte nele, beijava em seus lábios a música, as lendas, árvores, os tambores da ilha de onde ele vinha, que ela procurava possuir ardentemente tanto seu corpo quanto a ilha, que ela oferecia o próprio corpo as suas mãos assim como quem oferece aos ventos tropicais, e que as vibrações do prazer assemelhavam-se àquelas dos nadadores em mares tropicais. Sabina saboreava em seus lábios os temperos de sua ilha e havia sido nesta ilha também que ela aprendera a  maneira especial como  a acariciava, uma voluptuosidade sedosa, sem aspereza ou violência, parecida com a forma de seu corpo de ilha onde não aparecia nenhum osso.” 

 

Anaïs Nin, em “Uma espiã na casa do amor”

 

 

 

Às vésperas da VII Jornada Cyro Martins sobre Saúde Mental, com o tema “Transtorno Mental e Sexualidade”, o setor de Humanismo Médico do CELPCYRO vem referendar  esse  tema trazendo um trecho de Anaïs Nin, presente no livro Uma espiã na casa do amor, para tecer considerações sobre a Sexualidade em domínios como a Literatura e a Psicopatologia, tomando as Humanidades Médicas como referencial.

Consistindo a própria sexualidade em expressão fundamental do Humano, da essência biológica à manifestação cultural através dos tempos, podemos explorar a compreensão a seu respeito nas mais variadas formas. Assim, como profissionais de saúde, estaremos mais capacitados a compreender o indivíduo que nos procura, objetivo final da aplicação das Humanidades e das competências culturais em Medicina.

Refiro, inicialmente, um olhar sobre a importância da sensibilização às leituras possíveis que a sexualidade comporta, através da visão da Literatura, da Filosofia e das Artes em geral. Esta sensibilização deve ser ensinada e treinada com a equipe de saúde, preparando-a para as escutas possíveis com as quais ela deverá se deparar na conversa com o paciente. Este trabalho requer empenho e preparo sistemáticos: da parte dos “treinadores” ou orientadores e da equipe, na disposição para o aprendizado necessário. Tornar os profissionais de saúde sensíveis para a percepção de nuances no relato e nas expressões verbais e físicas dos indivíduos é tarefa que requer, também, motivação e persistência, principalmente quando o tema é complexo e diz respeito à intimidade e aos sentimentos do outro, a exemplo da sexualidade.

Na palestra "Humanidades Médicas: limites e Perspectivas no terceiro milênio", que farei durane a Pré-Jornada, apresento uma proposta de aplicação das Humanidades ao tema “sexualidade” como modelo integrativo, o qual reúne perspectivas técnico-científica e humanística. Essa abordagem da sexualidade no contexto da Pré-Jornada vem fazer a ponte com a temática da VII Jornada Cyro Martins sobre Saúde Mental - Transtornos Mentais e Sexualidade.

Parto de alguns questionamentos para discutir o uso de instrumental humanístico: de que forma podemos utilizar a Literatura, a Filosofia , as Artes em geral  em nossa prática no contexto da saúde mental? É possível  reconhecer as próprias limitações e, ainda assim,  abrir horizontes de ação para o olhar o indivíduo/paciente em sua totalidade? Como aprimorar, através das Humanidades Médicas, a aproximação das equipes de saúde ao tema da sexualidade, favorecendo o colóquio com o paciente?

A idéia proposta, então, é apresentar aos profissionais de saúde um modelo de sensibilização e treinamento, tomando a  temática da sexualidade, desde suas manifestações culturais, literárias e artísticas até a sua expressão na sala de consultas. “Mas quem tem tempo para isto, afinal?”, poderá perguntar o profissional da saúde – do médico e do residente ao enfermeiro, nutricionista ou fisioterapeuta. Aqui, retomo a relevância da integração das Humanidades Médicas como referencial de ensino e treinamento às equipes de saúde, de modo regular e sistemático. Se integradas à formação continuada, quando na condição de trabalho, as Humanidades poderão fazer parte do instrumental a ser utilizado na abordagem de situações difíceis. Possivelmente estarão tão acessíveis quanto os materiais de procedimento, exatamente por consistirem em modelo de prática rotineira.

Por que as Humanidades? Existem aspectos que não podem escapar à função do médico e dos demais profissionais da saúde em conhecer o paciente em suas várias facetas, além da orgânica per se. Cabe ressaltar que o universo sexual é tópico que merece toda a atenção, dada a complexidade em sua aproximação. Aqui, já percebemos alguns desafios: tanto da parte do indivíduo que procura auxílio, quanto da parte dos profissionais, muitas vezes há um impedimento na comunicação e na escuta da vivência da sexualidade do paciente. Isto pode ocorrer por limitações externas (escasso tempo de conversa, espaçamentos longos entre as consultas, etc.) como por limitações internas (dificuldades do paciente em se expor e do médico e profissional de saúde em abordar o tema com o paciente ou em compreender a linguagem deste ao comunicar suas dúvidas e indagações). Tais situações muitas vezes se juntam fazendo com que o assunto continue sendo deixado para a próxima consulta.

E então? O paciente não fala, o profissional de saúde não pergunta. De ambas as partes, muitas vezes, estão o não saber falar sobre e o não saber escutar as pistas no discurso.

Assim, proponho a reflexão sobre o recurso às Humanidades Médicas na preparação de médicos e equipes de saúde para a percepção, observação e vizinhança com  temas relevantes e seus “idiomas”. Partindo da literatura médica atual disponível em veículos de busca bibliográfica como pubmed, defendo que tal prática favoreceria maior intimidade com a linguagem e simbolização que, por exemplo, a sexualidade exige, nos vários pacientes, culturas e expressões. Além disso, o conhecimento de um novo instrumental, como o oferecido pelas artes, a literatura, a filosofia, permitiria abrir um canal de comunicação para  aprimorar as diversas leituras e escutas necessárias. É imprescindível buscar compreender o que o indivíduo “está querendo dizer” e, muitas vezes, expressa pelo silêncio ou constrangimento quanto à sua intimidade.

 

Tendo em vista tais aspectos, considero que as Humanidades podem ser úteis para ampliar o olhar dos profissionais de saúde para um tema de tamanha relevância como a sexualidade. Ressalto que esta é indagada, muitas vezes, apenas como aspecto formal da anamnese (onde com certeza deve estar presente, respeitando a formação tecno-científica do médico), mas deveria ser sempre investigada, também, como elemento presente na vida do indivíduo para além de seus sintomas.

Preparar a equipe de saúde para perceber as nuances nos relatos do paciente, observar suas reticências, escutar suas queixas, sintomas, metáforas e silêncio é tarefa complexa, mas necessária. O profissional deve ser adequadamente capacitado para a execução de suas habilidades tecno-científicas, mas também precisa estar instrumentalizado – a partir de sua sensibilização - para enfrentar o desafio de dialogar com o paciente de modo humanístico e efetivo, no intento de conhecer as informações sobre suas vivências, hábitos e percepções.

 

A oportunidade da VII Jornada Cyro Martins sobre Saúde Mental, com o tema central “Transtorno Mental e Sexualidade”, vem em ótimo momento, pois  a sexualidade e a relação amorosa são, de modo crescente, foco de atenção em saúde, pelas transformações que atravessam em nossa contemporaneidade, em âmbito mundial. Da  Literatura, Cultura e Neurociência  ao estudo do desenvolvimento de transtornos mentais associados,  tais temas assumem importância cada vez maior no olhar sobre o comportamento humano, como fenômeno transcultural. Menciono a relação amorosa como contexto em que pode estar inserida a sexualidade, ou do qual esta possa estar excluída. Mas há crescente necessidade em abordar-se tais temas em conjunto, ter  a possibilidade de conhecer o paciente em sua totalidade, visitando seus sentimentos, convivências, decisões e conflitos atravessam em nossa contemporaneidade, em âmbito mundial. Da Literatura,Cultura e Neurociência ao estudo dos desenvolvimento de transtornos mentais associados, as realçoes afetivas assumem importância cada vez maior no olhar sobre o comportamento humano, como fenômeno transcultural.atravessam em nossa contemporaneidade, em âmbito mundial.

Da Literatura,Cultura e Neurociência ao estudo dos desenvolvimento de transtornos mentais associados, as realçoes afetivas assumem importância cada vez maior no olhar sobre o comportamento humano, como fenômeno transcultural. O setor de Saúde Mental do CELPCYRO certamente vai propiciar à comunidade evento de importância efetiva, pela iniciativa do tema e pelos convidados de renome. Dentre estes. destaca-se o Psiquiatra turco Dr. Mehmet Zihni Sungur, cujo workshop  [Abordagem Cognitivo-comportamental: Aplicações na Terapia sexual e de Casal ] trará excelentes contribuições.

Da parte do setor de Humanismo Médico, aproveito a ocasião da Pré-Jornada para sublinhar nosso propósito de difusão do papel das Humanidades em Medicina e de desenvolvimento de projetos e publicações a esse respeito. 

Ao escolher convidados de excelência, como Profa. Dra. Cyana-Leahy-Dios,  Profa. Dra. Léa Masina e Dr. Rogério Gastal Xavier se pretende apresentar um panorama amplo e diversificado, que o Humanismo permite divisar, em busca de um olhar integral sobre o indivíduo.

 

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 *Médica Psiquiatra, Mestre em Psiquiatria.